Texto enviado por Zebedeu
Alertado pelo Tarzan sobre o pindura, Gaúcho veio lá de fora já com um cinto na mão, que eu não sei se ele retirou da própria calça ou pegou em algum lugar. Veio avançando como boi bravo. Atrás vinham o Tarzan e mais dois seguranças.
[Gaúcho] - Mas que palhaçada é essa?
[Eu, encagaçado] - S-seu gaúcho, é uma tradição. É o pindura!
- Quero lá saber de tradição de mauricinho filhodaputa? Aqui, comeu, paga, caralho.
Na outra mesa, as piranhas e os gigolôs calaram a boca na hora. Um silêncio perturbador tomou conta do local. Eu ainda tentei argumentar:
- É que...veja bem...
- Não tem "é", nem "u", nem "veja bem", nem "veja mal". Vai pagar ou entra no cacete. Aqui a guaiaca* canta!
E meteu uma cintada na mesa que quebrou dois copos e três pratos.
Começou a surgir caminhoneiros. Percebi que pela localização da mesa não havia a menor possibilidade de fuga. Ainda tentei uma última salvaguarda. Sabendo que se a coisa fosse levada às barras da lei não dava em nada, ainda perguntei
- O senhor não vai chamar a polícia?
- Polícia?? Aqui??? Huahuahuahuahuahua (riso grosso, que ecoou no salão)! Pues o Gaúcho não chama a polícia. É a polícia que chama o Gaúcho. E não estou aqui prá sustentar um bando de gaudérios*.
Mais caminhoneiros começaram a chegar.
[Eu, para o Tarzan] – Mas você não estava sabendo?
- Sabendo do que, filho?! Me deixa fora dessa, véio.
- Mas o Sansão não te avisou?
[Gaúcho] - Cala a boca, seu fresco de merda, mauricinho viado! Que porra de educação vocês aprendem naquela bosta de faculdade? Aprendem a dar calote? Aprendem a comer e beber no restaurante dos outros e não pagar? É por isso que advogado é tudo safado? Já aprende na faculdade?
Nessa altura do fato só restavam eu e o Sansão perto da mesa. Os outros quatro amigos estavam encurralados perto do balcão.
[Gaúcho] - Por aqui marica* não come de graça.
[Sansão, cutucando o dedo indicador no peito do Gaúcho] – Êpa...agora o senhor está ofendendo...
Pensei “putaqueupariu, fodeu”. O nariz do Sansão estava na altura do peito do Gaúcho.
[Gaúcho, dando a ordem] - Sereno (um dos seguranças), pega este magrinho colhudo*.
Sereno segurou Sansão pelos braços. Nesta hora reparei que já havia uns vinte caminhoneiros no salão e a porta da churrascaria tinha sido fechada.
[Gaúcho] - E tem mais. Se ninguém pagar essa merda quem vai pagar é o Tarzan. [Falando alto, bem na orelha do Tarzan] Trazer gaudério* filho da puta prá comer aqui? Tú pagas, seu bosta.
E voltando para o Sansão:
- Então, como é que é? Vai pagar ou não vai pagar?
- Não. Não “trusse” dinheiro.
- Olha que eu vou perguntar de novo porque eu sou bonzinho. Vai pagar ou não vai pagar?
- Não.
- Sereno, mete um manotaço* nesse bosta.
Sereno meteu a cabeça do Sansão na mesa. Bicho, eu não sou um cara violento. Nunca fui de briga. Sou plenamente de paz. Antes disso, nem me lembrava da última vez que havia me envolvido em confusão. Acho que ainda na infância, por alguma coisinha em um jogo de futebol. Mas vendo o Sansão apanhar, tive um lampejo de coragem. Dei dois passos de impulso e meti uma voadora no Sereno. Seria um voadora maravilhosa se tivesse acertado, porque o Sereno desviou e eu me esborrachei no chão. O outro segurança, quando viu a cena, pulou prá cima de mim e começou a me encher de porrada. Sansão conseguiu se livrar de Sereno e partiu prá me ajudar, dando um chute nas costas do cara que estava por cima de mim. Nesta hora a situação era a seguinte: eu apanhando, o Sansão apanhando e os outros colegas tentando esboçar uma reação, mas estavam encurralados por mais de vinte caminhoneiros e o Gaúcho havia segurado dois deles e estava jogando um contra o outro como se fosse uma sanfona. Subitamente a coisa parou. Os dois seguranças que estavam lutando com a gente pararam e eu percebi porque: a políca tinha chegado. Era uma patrulha da PM, chamada por alguém do lado de fora. Bicho, nunca na minha vida eu fiquei tão feliz em ver a polícia.
[Sargento da PM, com cara de xerife que vai resolver a parada] – Boa noite seu Gaúcho, quiqui está pegando por aqui? Vamos acalmar a situação aí, senão vai todo mundo pro distrito.
- Esses bostas comeram e não querem pagar.
- Xiiii, onze de agosto! Seu Gaúcho, já vou logo cantar a bola pro senhor. Não adianta levar o caso prá frente. Nenhum delegado vai abrir inquérito ou lavrar porra nenhuma.
Eu vi que o Gaúcho ficou vermelho de fúria, mas não ia podia fazer nada. Tarzan me olhou com um ódio assassino, já que a conta havia ficado com ele. Quando saímos prá fora, percebi que não havia um vidro sequer do meu carro inteiro, nem no do Sansão. Fomos embora devagarinho, pela Anhanguera, uma rodovia perigosa e movimentada, com vento na cara e com cuidado para não levar um estilhaço no olho. Mas saímos da treta com a sensação de dever cumprido. E ficamos famosos na faculdade, coisa que me rendeu até uma namorada. Bom, já se passaram alguns anos desde aquele fatídico dia, mas até hoje, quando passo ali pela Anhanguera, meu cú arrepia. Nunca mais vi o tal Gaúcho e até hoje eu não sei se foi o Tarzan que traiu a gente ou se foi o Sansão que pisou na jaca. Sansão hoje é um cara casado, que tem dois filhinhos, e nunca mais me deu problemas. Qualquer hora conto do acampamento em Ubatuba, outra merda do Sansão, 49 quilos e um metro e sessenta de “arrojo e fúria”.
Gauchês:
*Guaiaca: cinta de couro.
*Gaudério: vagabundo, aproveitador.
*Marica: viadinho, gay.
*Colhudo: corajoso.
*Manotaço: porrada.
Alertado pelo Tarzan sobre o pindura, Gaúcho veio lá de fora já com um cinto na mão, que eu não sei se ele retirou da própria calça ou pegou em algum lugar. Veio avançando como boi bravo. Atrás vinham o Tarzan e mais dois seguranças.
[Gaúcho] - Mas que palhaçada é essa?
[Eu, encagaçado] - S-seu gaúcho, é uma tradição. É o pindura!
- Quero lá saber de tradição de mauricinho filhodaputa? Aqui, comeu, paga, caralho.
Na outra mesa, as piranhas e os gigolôs calaram a boca na hora. Um silêncio perturbador tomou conta do local. Eu ainda tentei argumentar:
- É que...veja bem...
- Não tem "é", nem "u", nem "veja bem", nem "veja mal". Vai pagar ou entra no cacete. Aqui a guaiaca* canta!
E meteu uma cintada na mesa que quebrou dois copos e três pratos.
Começou a surgir caminhoneiros. Percebi que pela localização da mesa não havia a menor possibilidade de fuga. Ainda tentei uma última salvaguarda. Sabendo que se a coisa fosse levada às barras da lei não dava em nada, ainda perguntei
- O senhor não vai chamar a polícia?
- Polícia?? Aqui??? Huahuahuahuahuahua (riso grosso, que ecoou no salão)! Pues o Gaúcho não chama a polícia. É a polícia que chama o Gaúcho. E não estou aqui prá sustentar um bando de gaudérios*.
Mais caminhoneiros começaram a chegar.
[Eu, para o Tarzan] – Mas você não estava sabendo?
- Sabendo do que, filho?! Me deixa fora dessa, véio.
- Mas o Sansão não te avisou?
[Gaúcho] - Cala a boca, seu fresco de merda, mauricinho viado! Que porra de educação vocês aprendem naquela bosta de faculdade? Aprendem a dar calote? Aprendem a comer e beber no restaurante dos outros e não pagar? É por isso que advogado é tudo safado? Já aprende na faculdade?
Nessa altura do fato só restavam eu e o Sansão perto da mesa. Os outros quatro amigos estavam encurralados perto do balcão.
[Gaúcho] - Por aqui marica* não come de graça.
[Sansão, cutucando o dedo indicador no peito do Gaúcho] – Êpa...agora o senhor está ofendendo...
Pensei “putaqueupariu, fodeu”. O nariz do Sansão estava na altura do peito do Gaúcho.
[Gaúcho, dando a ordem] - Sereno (um dos seguranças), pega este magrinho colhudo*.
Sereno segurou Sansão pelos braços. Nesta hora reparei que já havia uns vinte caminhoneiros no salão e a porta da churrascaria tinha sido fechada.
[Gaúcho] - E tem mais. Se ninguém pagar essa merda quem vai pagar é o Tarzan. [Falando alto, bem na orelha do Tarzan] Trazer gaudério* filho da puta prá comer aqui? Tú pagas, seu bosta.
E voltando para o Sansão:
- Então, como é que é? Vai pagar ou não vai pagar?
- Não. Não “trusse” dinheiro.
- Olha que eu vou perguntar de novo porque eu sou bonzinho. Vai pagar ou não vai pagar?
- Não.
- Sereno, mete um manotaço* nesse bosta.
Sereno meteu a cabeça do Sansão na mesa. Bicho, eu não sou um cara violento. Nunca fui de briga. Sou plenamente de paz. Antes disso, nem me lembrava da última vez que havia me envolvido em confusão. Acho que ainda na infância, por alguma coisinha em um jogo de futebol. Mas vendo o Sansão apanhar, tive um lampejo de coragem. Dei dois passos de impulso e meti uma voadora no Sereno. Seria um voadora maravilhosa se tivesse acertado, porque o Sereno desviou e eu me esborrachei no chão. O outro segurança, quando viu a cena, pulou prá cima de mim e começou a me encher de porrada. Sansão conseguiu se livrar de Sereno e partiu prá me ajudar, dando um chute nas costas do cara que estava por cima de mim. Nesta hora a situação era a seguinte: eu apanhando, o Sansão apanhando e os outros colegas tentando esboçar uma reação, mas estavam encurralados por mais de vinte caminhoneiros e o Gaúcho havia segurado dois deles e estava jogando um contra o outro como se fosse uma sanfona. Subitamente a coisa parou. Os dois seguranças que estavam lutando com a gente pararam e eu percebi porque: a políca tinha chegado. Era uma patrulha da PM, chamada por alguém do lado de fora. Bicho, nunca na minha vida eu fiquei tão feliz em ver a polícia.
[Sargento da PM, com cara de xerife que vai resolver a parada] – Boa noite seu Gaúcho, quiqui está pegando por aqui? Vamos acalmar a situação aí, senão vai todo mundo pro distrito.
- Esses bostas comeram e não querem pagar.
- Xiiii, onze de agosto! Seu Gaúcho, já vou logo cantar a bola pro senhor. Não adianta levar o caso prá frente. Nenhum delegado vai abrir inquérito ou lavrar porra nenhuma.
Eu vi que o Gaúcho ficou vermelho de fúria, mas não ia podia fazer nada. Tarzan me olhou com um ódio assassino, já que a conta havia ficado com ele. Quando saímos prá fora, percebi que não havia um vidro sequer do meu carro inteiro, nem no do Sansão. Fomos embora devagarinho, pela Anhanguera, uma rodovia perigosa e movimentada, com vento na cara e com cuidado para não levar um estilhaço no olho. Mas saímos da treta com a sensação de dever cumprido. E ficamos famosos na faculdade, coisa que me rendeu até uma namorada. Bom, já se passaram alguns anos desde aquele fatídico dia, mas até hoje, quando passo ali pela Anhanguera, meu cú arrepia. Nunca mais vi o tal Gaúcho e até hoje eu não sei se foi o Tarzan que traiu a gente ou se foi o Sansão que pisou na jaca. Sansão hoje é um cara casado, que tem dois filhinhos, e nunca mais me deu problemas. Qualquer hora conto do acampamento em Ubatuba, outra merda do Sansão, 49 quilos e um metro e sessenta de “arrojo e fúria”.
Gauchês:
*Guaiaca: cinta de couro.
*Gaudério: vagabundo, aproveitador.
*Marica: viadinho, gay.
*Colhudo: corajoso.
*Manotaço: porrada.